quarta-feira, 23 de julho de 2008

Janela


Das coisas que eu acho bonitas na vida, as janelas sempre tiveram um lugar especial no meu imaginário. Desde pequena me fascinam cada uma com seu jeito. Quando morava em Governador Valadares, sempre escolhia a poltrona 27 do ônibus para viajar, tinha janela grande e larga pra ver o céu a noite enquanto as curvas perigosas ficavam pra trás. O lugar que eu morava lá foi escolhido por conta da janela da sala. A janela era tão grande que era porta! e dela, eu via o pico do Ibituruna e a lua cheia apontando na serra.
No Jequitinhonha, as janelas encantavam pela simplicidade e exclusividade de cada forma de madeira semi aberta, pintada à mão. As senhoras ficavam debruçadas sobre elas, vendo o tempo acontecer e as novidades aparecerem. Vez ou outra alguém acenava com alegria e convidada pra um café à beira do fogão a lenha.
Um sonho com uma janela foi o motivo da minha viagem para o exterior. Lá eu virava de costas para tudo de ruim que me acontecia e via numa janela grande um lugar verde, sereno e bem distante. Pra lá fui e encontrei várias janelas que me fizeram sorrir. Da casa do Gonçalo via parte da querida Lisboa acordar; do quarto da Roberta via pequenas bicicletas trançarem por Bologna; do sótão do Antonio encontrava canteiros de flores azuis e vermelhas pregados nas janelas suiças; da janela do Fabian via a torre Eiffel piscar todas suas luzes à meia noite; do quarto do Gláucio via uma Alemanha linda que sobreviveu bravamente às guerras e da casa do Fernando assisti as ruas de Londres com toda a sua loucura. Mas houve uma janela muito especial, que a imagem durava apenas segundos e me fazia pensar na finitude e plenitude de aproveitar cada segundo. Foi da janela do trem que me emocionei várias vezes. Vez ou outra, o trem silenciava tudo e uma sensação de paz extrema tocava todo o meu corpo. Lá fora, campos amarelos que passavam rápido e quando eu percebia que era amarelo de flores, elas já tinham ficado pra trás. Era primavera, e eu vi os girassóis, os tetos que amparavam a neve no inverno, os campos que brotavam vida pouco a pouco dos seis meses intensos de frio. Impressionante como tudo brotava rápido sob a fraca luz do sol. É realmente preciso muito pouca luz para renovar todas as coisas e agora entendo minha aflição em ter morado no apartamento que eu vivia aqui perto. As janelas davam para outras janelas ocupadas e eu não via nada, porque não me interesso pela vida alheia. Não gosto de olhar e ver um muro à minha frente. Gosto de ver longe... porque de tanto mirar as coisas distantes, acabo chegando até lá.

2 comentários:

  1. É interessante pensar nas janelas, e mais interessante, e poder vivenciar tudo o que você passou através de suas palavras, acaba que isso se torna uma experiência ate mesmo pra mim, que sou leitor das suas histórias magníficas de vida.

    ResponderExcluir

Seu comentário será lido com prazer. Muito obrigada!