segunda-feira, 16 de junho de 2008

Restos

Quando o caminhão parou não imaginava que aquela cena traria água aos olhos. Caixas empoeiradas e tábuas enroladas em lona, restos de um relacionamento intenso e anteriormente eterno. Histórias se não são contadas transformam-se em trapos e coisas comuns, em lixo. A sorte é que outras mãos podem dar outro sentido ao resto que sobra. Outras pessoas podem resignificar as histórias e modificar o contexto de uma caixa empoeirada. Foi minha mãe que me ajudou a mudar essa história. Muita água, sabão e vontade. Em dois dias era outro quarto, outros móveis, outras cores. Em cada coisa tirei as lembranças do outro que era parte de mim e coloquei minha vivência. Enfeites do outro lado do mundo que conquistei sozinha, novos objetos, nova forma de arranjo. E ao dormir, era outro lugar, ainda que com visão semelhante ao velho e cheiro antigo de dias felizes. Engano pensar que o tempo que se passou é o tempo feliz da sua vida. O tempo de agora é que é. O tempo que vem, novo em folha para desenhar os seus dias e reescrever sua história. Existirão sempre os restos, e sempre a pergunta sartreana que me acompanha: o que farei com o que fizeram de mim até aqui? Hoje sei que com a ajuda de outras mãos posso, aos poucos,deixar as marcas desaparecerem por si mesmas e com o resto de mim, fazer tudo. Tudo novo.

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